SLOW SHOP

12 de março de 2014

Demorou muitas décadas, mas finalmente uma parcela da população mundial aprendeu que fast food não faz bem para a saúde, que rapidez no atendimento não é sinônimo de qualidade de produto ou eficiência de serviço. Nesse meio tempo uma quantidade incontável de pessoas perdeu a saúde e a vida. Em resposta a essa aberração, surgiu o movimento slow food, que sempre me pareceu tão óbvio quanto respirar.

Comer devagar, escolher a refeição, comer bem acompanhado, mastigar lentamente, comer produtos locais, alimentos de estação, conversar, pensar, tomar cafezinho depois, bem devagarzinho, alimenta tanto quanto o arroz e o feijão no prato.

Agora acho que está na hora de repensarmos nosso ritmo de compras, nossa ânsia de gastar dinheiro.

Há seis meses saí da cidade de São Paulo e seus 20 milhões de habitantes para viver em uma fazenda na zona rural da Serra da Mantiqueira. Moro em Gonçalves, Minas Gerais, um município de 3 mil habitantes, sendo que 2 mil vivem na área rural. Minha casa fica a 14 quilômetros da agência de correios mais próxima, que só tem um atendente, abre tarde, fecha cedo e tranca a porta na hora do almoço.

Não sou aposentado. Vim para o mato para trabalhar. Montei com minha esposa uma escola de esportes de aventura com hospedagem e alimentação. Também temos uma editora com títulos do segmento turismo aventura e um site onde vendemos nossos cursos, livros e alguns produtos novos e seminovos em ótimo estado.

Na descrição de venda dos nossos livros existe um aviso pouco comum no comércio online: explicamos que nosso prazo de envio é de uma semana e que o produto pode demorar até duas semanas para chegar ao comprador. Normalmente compras online são despachadas no mesmo dia. Isso inclusive é considerado um “benefício”, um “sinal de respeito” ao consumidor.

Bobagem e burrice. Um equívoco de valores muito parecido ao fast food.

Sou adepto do slow shop.

Inventei esse termo para explicar o processo, que para mim também é tão óbvio quanto respirar, de pensar muito antes de comprar, escolher, comparar, analisar a necessidade real da compra, ser gentil com o vendedor, ter paciência de esperar o produto chegar, ter calma na hora de abrir e reaproveitar a embalagem. Enfim, não se deixar levar pelo frenesi do consumo.

Semanalmente recebo emails de consumidores revoltados com a demora em receber os livros e produtos adquiridos no nosso site. Gente que lê, mas não assimila a mensagem de lentidão na entrega. O padrão de presteza é tão arraigado que qualquer lentidão é considerada “absurda”.

Morro de dar risada com as mensagens que começam por citar o Código de Defesa do Consumidor, a “Bíblia do Brasil emergente”.

Indicando um prazo mais elástico de remessa, não estamos infringindo nenhuma regra de consumo. Quem compra no nosso site sabe antecipadamente que não vamos correr para entregar o pedido. Isso não é sinal de desrespeito, é apenas atitude coerente. Não viemos viver na roça para manter o ritmo frenético da cidade. Não comemos rápido, não compramos rápido, não vendemos rápido. Não estamos dispostos ou interessados em viver rápido.

O Brasil ganhou muito com o Código de Defesa do Consumidor, isso é inegável. Há quem diga que lucramos também com a Copa do Mundo e as Olimpíadas em nossas terras. Eu penso um pouco diferente. Gostaria de ver o Código dos Direitos Humanos em exposição em todos estabelecimentos comerciais, todas delegacias de polícia, todas as repartições públicas, todas as residências brasileiras ao invés de um manual de consumo. Eu preferiria ver o Brasil construir escolas, parques, museus, teatros ao invés de estádios de futebol.

Sinceramente, não vejo progresso em uma nação que pensa que futebol é arte e confunde cidadania com direito de consumidor.

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